
“Uma conseqüência direta da alienação do homem com relação ao produto de seu trabalho, a sua atividade vital e à vida de sua espécie é o fato de que o homem se aliena dos outros homens....
Toda alienação do homem de si mesmo e da natureza surge na relação que ele postula entre outros homens, ele próprio e a natureza.” Karl Marx (Manuscritos Econômicos e Filosóficos)
A significação dada a alienação por Marx é o estado no qual um indivíduo, ou grupo, ou instituição, ou uma sociedade de modo mais geral, permanecem alheios, estranhos aos resultados ou produtos de sua própria atividade, a outros seres humanos, à natureza na qual vivem. A alienação é sempre alienação de si próprio (auto-alienação), alienação do homem, de seu ser próprio em relação a si mesmo, às suas possibilidades humanas.
O homem alienado não é um agente ativo de seu controle sobre a realidade (tendo a realidade como socialmente construída), permanece alheio ou estranho a ela. Alienar-se é, em última análise, vivenciar o mundo e a si mesmo passivamente, receptivamente, com o sujeito separado do objeto. Podemos considerar três grandes modos de alienação na sociedade capitalista: Alienação Social, Alienação Econômica e Alienação Intelectual.
Marx concluiu que a alienação social é o desconhecimento das condições históricas e sociais concretas na qual vivemos, produzidas pela ação humana sob o peso de outras condições históricas. Marx observou que no processo da alienação social há uma dupla alienação:
1. Os homens não se reconhecem como agentes e autores da vida social com suas instituições;
2. Por sua vez julgam-se livres e capazes de mudar suas vidas como e quando quiserem, apesar das determinações históricas e das instituições que eles mesmos criaram. Nesse caso ignoram que a sociedade que criaram determina seus pensamentos e ações.
A alienação é uma das características da democracia burguesa representativa. Alienação que representa a perda do homem, de sua transformação em objeto, e cujo pensamento marxista protesta contrariamente. O desligamento cada vez maior dos indivíduos das obrigações e identidades costumeiras, corporativas, normativas e comunitárias foi uma das marcas da ascensão do capitalismo. As relações sociais capitalistas promoveram, e ainda promovem, a desvalorização da cidadania.
O princípio da democracia representativa foi enunciado pelo advogado estadunidense Alexander Hamilton, e foi inventada a partir da criação dos Estados Unidos da América. Hamilton partiu da premissa de que a “multidão trabalhadora” busque em seus “superiores sociais” a sua voz política. Na visão federalista, esse era o meio de evitar ou contornar “parcialmente” a democracia, criando uma cidadania passiva. A democracia representativa americana, que serviu de modelo para muitos países e foi imposta em outros, não incentiva o exercício do poder político, mas a renúncia desse poder, transferido-o para outros, ou seja, a sua alienação. A classe dominante utiliza-se de todas as formas possíveis da superestrutura ideológica para manter as grandes massas alienadas, impossibilitadas, portanto, de se reconhecerem como sujeito histórico, capaz de transformar o mundo e a sociedade em que vivem. A mesma classe dominante que se apropria dos Aparelhos Ideológicos de Estado e os utiliza como armas de convencimento e dominação para aumentar o grau de alienação das grandes massas e aplastar sua consciência, afastando-as cada vez mais da possibilidade de se assumirem como sujeito histórico de uma sociedade onde impere a Justiça Social.
O Estado Americano estabeleceu, então, essa definição de “democracia”, em que a transferência do poder do povo para seus representantes constitui sua própria essência, ou seja, a identificação da representação com a alienação do poder. A discussão, porém, não deve se dar apenas em torno, da questão da representatividade como forma de distanciar o povo, e sim, também, pelo fato dela, nesse modelo, favorecer as classes proprietárias. O modelo de democracia representativa considera que há uma grande distância entre o “bem público” e a vontade dos cidadãos, mudando o foco da política da localidade para o centro federal, criando um esvaziamento completo de todo conteúdo social do conceito de democracia.
É necessário construir a resistência, procurando intervir na realidade que se forma, criando uma identidade para o povo a partir do lugar onde ele mora. É do lugar onde ele mora que se articulam as principais relações (família, amigos e vizinhos). Seu habitat é um espaço privilegiado para se educar, trocar informações e conhecimentos, intervir na realidade, enriquecer as relações. A comunidade é um espaço propício para a socialização. A rede de relação mais próxima acontece na própria comunidade, que deve ser uma instituição levada a sério pelos seus moradores e pelo poder público. É um espaço promissor para a concretização da democracia participativa.
Essa noção espacial de que a cidadania se dá a partir do lugar onde se mora, nos leva a desejar que a construção desse espaço seja uma coisa que não venha de fora para dentro, mas que parta de uma concepção local, emergente, envolvendo informação, conhecimento, cultura, educação, esporte, lazer, música e a comunidade em um papel agregador. O foco deve ser a rede de relações a partir da comunidade, rompendo com uma realidade cultural que deseduca. A cidadania, termo muito usado tem que ser materializada, não pode ficar somente nos discursos, ou seja, no abstrato, no subjetivo, tem que ser objetivada. Se a cidadania não for expressa de maneira prática na vida das pessoas, ela perde o sentido, vira um ‘chavão’ e acaba por desencantar. Quando se começa a exercitar a cidadania a partir do lugar onde as pessoas vivem, a possibilidade de expansão democrática e alteração revolucionária da realidade se dará a partir das bases, permitindo o micro intervir no macro. Há, pois, a necessidade de mudança no processo educativo, na cultura, abrindo perspectivas de mudanças no comportamento coletivo.
Marx está fundamentalmente interessado na emancipação do homem como indivíduo, na superação da alienação, na restauração da capacidade dele para relacionar-se inteiramente com seus semelhantes e com a natureza. A desalienação é um apelo em favor de uma modificação revolucionária do mundo, da reintegração do homem, seu retorno a sim mesmo, a superação da alienação do homem, da apropriação real da natureza humana através do homem e para o homem.
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